abril 23, 2017

Fé e Boas Obras


Tiago não pensa que por meio de boas obras merecemos remissão dos pecados e graça. Pois fala das obras dos justificados, que já estão reconciliados e aceitos, havendo conseguido remissão dos pecados. Razão por que erram os adversários [os sinergistas] quando inferem daqui ensinar Tiago que, por intermédio de boas obras, merecemos remissão de pecados e graça, que, por nossas obras, temos acesso a Deus, sem o Cristo propiciador...
Da regeneração, Tiago disse pouco antes que ela se realiza pelo evangelho. Pois que diz assim: "Segundo o seu querer ele nos gerou pela palavra da verdade, para que fôssemos como primícias das suas criaturas" (Tg 1.8) Dizendo que renascemos por meio do evangelho, ensina que nascemos e fomos justificados mediante a fé. Pois a promessa respeito a Cristo apreende-se unicamente pela fé, quando a opomos aos terrores do pecado e da morte. Tiago, por conseguinte, não pensa que renascemos por nossas obras.
Evidencia-se daí que Tiago não nos adversa a nós, ele, que, ao censurar mentes ociosas e seguras, as quais sonhavam que tinham fé quando não a tinham, distinguiu entre fé morta e fé viva. Morta, diz ele, é a que não produz boas obras, e viva a que produz. Além disso, já declaramos muitas vezes o que é que chamamos fé. Não falamos de uma notícia ociosa, que os demônios também possuem, mas de fé que resiste aos terrores da consciência, erigindo e consolando corações aterrorizados. Tal fé não é coisa fácil, como sonham os adversários, nem poder humano. É, isto sim, poder divino pelo qual somos vivificados e vencemos o pecado e a morte. Assim como diz São Paulo aos colossenses, a saber, que a fé é eficaz pelo poder de Deus e vence a morte: "No qual igualmente fostes ressuscitados mediante a fé no poder de Deus" (Cl 2.12). Esta fé, sendo vida nova, necessariamente gera novos movimentos e obras. Por isso, Tiago acertadamente nega que sejamos justificados por uma fé sem obras. Quando, porém, diz que somos justificados por fé e obras, certamente não diz que renascemos pelas obras. Nem diz que, em parte, Cristo é nosso propiciador e que, em parte, nossas obras são propiciação. Nem descreve, aqui, o modo da justificação; descreve como são os justos, depois de justificados e renascidos. E, "ser justificado", aqui, não significa "fazer do ímpio um justo", significa, sendo uso forense, "ser pronunciado justo". Como nesta passagem: "Os que praticam a lei hão de ser justificados" (Rm 2.13). Assim, pois, como nada de molesto tem estas palavras: "Os que praticam a lei hão de ser justificados", da mesma forma pensamos sobre as palavras de Tiago: "O homem é justificado por obras, e não por fé somente" (Tg 2.24); porque, seguramente, são pronunciados justos os homens que têm fé e boas obras. Sim, pois as obras dos santos, como dissemos, são justiças e agradam em razão da fé. Pois Tiago inculca apenas as obras produzidas pela fé, conforme atesta ao dizer de Abraão: "A fé opera juntamente com as suas obras" (Tg 2.22)

Apologia da Confissão de Augsburgo IV, 246-252

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