fevereiro 21, 2017

Liturgia e Escatologia

Redeemer Lutheran Church-Fort Wayne

A liturgia do Culto Divino celebrada nas comunidades luteranas confessionais é uma tradição que ultrapassa séculos e carrega uma infinidade de significados que nos auxiliam a compreender melhor a Palavra de Deus. Por vezes, durante a história da igreja, em que passamos por discussões e tribulações com relação à doutrina, a liturgia foi responsável por guardar tesouros da fé que nos são expressos de maneira clara hoje. Este é o caso da Eucaristia, por exemplo. O que muitos não sabem, porém, é que a liturgia também carrega um grande conteúdo escatológico. E este é o objetivo deste texto: demonstrar aos nossos leitores a profunda ligação que a liturgia histórica tem com os eventos finais e a volta de nosso Senhor Jesus Cristo.

Invocação

"Em nome do Pai, do Filho e do Espírito Santo". Quantas vezes ouvimos essas palavras? No entanto, elas testemunham renovadas vezes a nossa identidade como filhos de Deus que foram batizados na morte e ressurreição de Jesus. Não seria algo bom se os cristãos se lembrassem de que, cada vez, ao ouvirem as palavras da Invocação, traçassem o sinal da cruz como um lembrete visível de seu batismo? Infelizmente este é um costume que vem se perdendo.

São Paulo lindamente capta o significado eterno de nosso batismo em Cristo quando escreve aos Gálatas que "os que em Cristo foram batizados, de Cristo se revestiram." (Gálatas 3:27). Nós estamos vestidos com a justiça de Cristo. Ao contrário do homem na parábola da festa de casamento que não tinha roupas de casamento, quando estivermos diante de nosso juiz no último dia, estaremos vestidos e cobertos, vestidos com a pureza de Cristo.

"Em nome do Pai, do Filho e do Espírito Santo". Já neste céu na terra, neste momento que chamamos de culto divino, estamos firmes diante do Deus Uno e Trino, que nos chamou das trevas para sua maravilhosa Luz por meio do Evangelho.

Confissão e Absolvição

Podemos realmente nos aproximar de Deus com confiança. E ainda, porque estamos neste período que antecede a vinda de nosso Senhor Jesus Cristo, temos conosco o diabo, o mundo e nossa carne pecaminosa. Nós ainda não enfrentamos o julgamento final. E assim, com o pecado ainda trabalhando em nós, a condenação da Lei de Deus ainda deve nos confrontar, para que não tenhamos delírios de que possamos ter algo de que se vangloriar diante de nosso poderoso Juiz.

Acima de tudo, Confissão e Absolvição nos mantêm honestos - honestos conosco mesmos e honestos diante de Deus. O ato de confissão não é nenhuma obra que colocamos diante do trono do Pai; Ao contrário, é o simples reconhecimento de que a Palavra de Deus é verdadeira e correta e que, quando nos analisamos em relação às suas exigências, nos reconhecemos como pecadores miseráveis.

A Palavra de Deus diz "não darás falso testemunho", mas na verdade mentimos, fofocamos e caluniamos. E assim, o cristão confessa: "Senhor, a Tua Palavra é verdadeira; Eu pequei." Existem duas maneiras básicas de lidar com o pecado e a culpa. Um deles é ignorá-los ou minimizá-los. Todos nós somos tentados nessa sentido mais do que algumas vezes. 

A outra maneira é dar ao pecado e à culpa o devido lugar, e depois silenciá-los. Esse é o caminho da absolvição de Deus. Com seu perdão, nosso pecado é removido de nós.

Os cristãos sabem disso, mas também precisam ouvir esta verdade constantemente. Precisamos ser lembrados de que essas palavras familiares, "Eu perdoo todos os seus pecados", não são apenas alguns anúncios impessoais. Dizem o que significam e cumprem o que prometem. O próprio Jesus disse a seus discípulos que os pecados que eles perdoam são perdoados (João 20:23).

Nas páginas finais das Crônicas de Nárnia , C.S Lewis fornece uma descrição maravilhosa do julgamento final.

Como cada indivíduo vem diante de Aslan - o leão que é a figura de Lewis para Cristo - uma das duas coisas acontece: ou a pessoa olha diretamente para o rosto de Aslan e reconhece seu semblante perdoador, ou, ao ver a conduta severa do leão, cai imediatamente em desespero, se separando para sempre de Cristo.

Na Confissão e Absolvição estamos sendo preparados para nossa aparição diante de Cristo no Último Dia. E crentes nas palavras reconfortantes que nossos pecados são perdoados, nosso Senhor nos convida: "Vinde, benditos de meu pai, herdai o reino preparado para vós desde a fundação do mundo" (Mateus 25:34).

Quando o Senhor falar essas palavras para nós no Último Dia, a Confissão e a Absolução, como a conhecemos, cessarão, pois então nos deleitaremos na eterna absolvição do Cordeiro.

Kyrie

Neste mundo de pecado e morte, os cristãos têm muitas oportunidades de se juntarem à breve, porém abrangente, oração do Kyrie: "Senhor, tem misericórdia". Ao nosso redor vemos os resultados do ódio, inveja, luxúria e ganância. Certamente, o mundo precisa da misericórdia de Deus. Não é de admirar que a igreja, em sua adoração, implore diante de Deus em nome do mundo inteiro. É uma oração que ninguém mais vai orar.

No entanto, quando clamamos: "Senhor, tem misericórdia", há confiança em nossas vozes porque sabemos que Deus é realmente misericordioso. Ele deseja trazer alívio para o sofrimento que está ao nosso redor. A nossa oração nem sempre pode trazer uma resposta imediata - pelo menos, não a resposta que estamos buscando - mas mesmo assim, recomendamos a nós mesmos e ao mundo inteiro a um Deus misericordioso.

Como a confissão de pecados, no entanto, nosso clamor por misericórdia será silenciado no céu. Lá veremos os resultados da misericórdia de Deus, como diante do trono e diante do Cordeiro estarão todos os redimidos - nenhum deles digno da honra.

Hino de louvor

Na noite do nascimento de Jesus, os anjos entoaram o seu canto de louvor: "Glória a Deus nas alturas, e paz na terra aos homens aos quais ele concede o seu favor". Nessa ocasião específica, o louvor dos anjos deu a notícia de que o Filho de Deus havia se feito criança. O céu desceu à terra! E desde então, a Igreja tem continuado a se alegrar neste milagre da nossa salvação.

As primeiras palavras da Gloria in Excelsis são seguidas por um hino de louvor ao Deus Uno e Trino. Pode-se imaginar os fiéis cantando estas palavras no céu: "A ti louvamos, bendizemos, adoramos, a ti glorificamos, e rendemos graças por tua grande glória".

Nosso foco está no Filho encarnado de Deus, o Filho unigênito, o Cordeiro de Deus, e único Filho do Pai. E se isso não é suficiente para nomear este que é o objeto de nossa adoração e louvor, duas vezes nós cantamos, "Tu que tiras o pecado do mundo."

Lá está, o coração e a substância da fé cristã. No céu estaremos reunidos em torno do trono do Cordeiro, confessando que só ele é santo, só ele é o Senhor. Nos tempos mais recentes, a Igreja Luterana na América do Norte fez uma contribuição significativa para a liturgia da igreja através do Hino Alternativo de Louvor, "This is the Feast."

Expressão da descrição do céu no Apocalipse de São João, nossas vozes são unidas àquela multidão celestial enquanto cantamos com eles: "Digno é o Cordeiro que foi morto de receber poder, riqueza, sabedoria, força, honra, glória e louvor" (Apocalipse 5:12)

Palavra de Deus e Homilia

Não é o costume de muitas comunidades luteranas brasileiras, mas uma tradição antiga adotada por muitas comunidades cristãs o costume de concluir a leitura da Sagrada Escritura durante o culto divino com a frase: "Esta é a Palavra do Senhor!" Mais do que apenas uma "palavra" de Deus, esta é a sua revelação na qual ele nos faz saber a sua vontade, mais especificamente a sua vontade misericordiosa que deseja nossa salvação.

Em última análise, esta palavra nos aponta para a Palavra, o Filho encarnado de Deus. Ele é a revelação final e completa de Deus para nós, o espelho do coração do Pai. Esse é o ponto que o escritor aos hebreus faz nos versos iniciais de sua epístola: "Há muito tempo Deus falou muitas vezes e de várias maneiras aos nossos antepassados por meio dos profetas, mas nestes últimos dias falou-nos por meio do Filho"(Hb 1: 1-2a). Somente através dele - o Filho unigênito de Deus - somos capazes de conhecer o favor e a graça do Pai.

Na homilia, a Palavra de Deus é trazida sobre a vida dos ouvintes. Este é o equivalente a sentar-se aos pés de Jesus. Mas é mais do que mera instrução. Através da homilia, Deus nos fala com sua espada de dois gumes de condenação e promessa, Lei e Evangelho. O assunto do sermão é tanto Deus como nós. Através do sermão chegamos a uma melhor compreensão de nós mesmos, especialmente a nossa necessidade de perdão de Deus. Mas também nos deparamos com a misericórdia e o amor de Deus.

Semana após semana, os fiéis de Deus ouvem a voz de seu Bom Pastor, preparando-os, em certo sentido, para aquele último dia em que Jesus os chama para sua recompensa eterna.

Credo

No curso de seu ministério terreno, Jesus colocou esta difícil pergunta aos seus discípulos: "Quem vocês dizem que eu sou?" Ele não estava pedindo as opiniões das multidões. Ele queria uma confissão de fé.

Na realidade, esta confissão não é diferente da confissão de pecados. Em ambos, reconhecemos que o que Deus disse é verdade. Quando confessamos nossos pecados, reconhecemos a verdade que Deus fala sobre nós - que somos pecadores. Quando confessamos a fé da igreja no credo, nossa confissão fala de Deus - quem ele é e o que fez.

Em cada época, a mesma pergunta é colocada à igreja: quem vocês dizem que eu sou? Ao abrirmos nossas bocas e dizermos: "Eu creio em Deus, o Pai Todo-Poderoso ...", confessamos uma verdade profunda que passou saiu dos lábios dos cristãos durante os séculos passados.

Esta confissão do Deus Uno e Trino não é propriedade de nenhum indivíduo, mas de toda a igreja, incluindo toda a Igreja Triunfante. São muitos os santos e mártires que deram suas vidas enquanto defendiam as verdades que nós confessamos nos credos.

Pense em Atanásio, aquele fiel pastor e confessor do século IV, que foi exilado inúmeras vezes por sua defesa da verdade contra os falsos mestres de seu tempo. Ou Lutero, que se manteve firme contra o enorme poder da Igreja Romana e do Sacro Império Romano.

Em nossos dias, há cristãos fiéis que arriscam suas vidas - e às vezes morrem - ao confessar essas verdades. No Apocalipse de São João, encontramos a confissão acontecendo no céu. Basta ouvir os trechos da grande confissão que gira em torno do trono de Deus:


"Santo, santo, santo é o Senhor, 
o Deus todo-poderoso, que era, 
que é e que há de vir" (4: 8b)

"Tu, Senhor e Deus nosso, 
és digno de receber a glória, 
a honra e o poder, porque 
criaste todas as coisas, e 
por tua vontade elas existem 
e foram criadas" (4:11).

"Tu és digno de receber o livro e 
de abrir os seus selos, pois foste morto, 
e com teu sangue compraste para Deus 
homens de toda tribo, língua, povo e nação.
Tu os constituíste reino e sacerdotes para o 
nosso Deus, e eles reinarão sobre a terra". (5: 9-10).

Da mesma forma, enquanto estamos em um terreno sagrado onde Jesus vem em sua Palavra e Sacramentos, nos juntamos àquela nobre companhia de santos e mártires, confessando estas santas verdades concernentes ao Deus Uno e Trino.

Ofertório

"O que devo dar ao Senhor?" A verdade é que não temos nada para dar à Deus. Não trouxemos nada a este mundo, e não levaremos nada conosco quando partirmos. Como Jesus tão pungentemente nos diz, nossos tesouros já estão armazenados para nós no céu (Mateus 6: 19-21). Há, no entanto, uma oferta que fazemos, tanto agora em nossa adoração e um dia no próprio céu. É o sacrifício de ação de graças quando invocamos o nome do Senhor (Salmo 116: 17).

Na Apologia à Confissão de Augsburgo (Artigo XXIV), este sacrifício eucarístico é cuidadosamente distinguido do sacrifício propiciatório de Cristo. O sacrifício pelos pecados pertence somente a Ele. Quando reconhecemos a nossa exata condição - que estamos no recebimento da bondosa misericordiosa de Deus - então o sacrifício de ação de graças não pode deixar de fluir dos nossos lábios quando damos nosso agradecimento àquele que deu tudo por nós.

A doação de nossas primícias, seja dinheiro ou bens, tempo ou talentos, é também parte desse sacrifício de ação de graças. Nossas bocas não podem permanecer separadas do resto de nossos corpos. Se a ação de graças está fluindo de nossos lábios, então ela também se expressará na doação de nós mesmos por causa de Cristo e do próximo.

Sanctus

Se alguma parte do serviço é reconhecida como fornecendo um vislumbre do céu, é o Sanctus: "Santo, santo, santo, Senhor Deus dos Exércitos, o céu e a terra estão cheios de tua glória".

Este é o cântico eterno dos anjos que pairam sobre o trono de Deus na visão do céu que foi dada a Isaías (Is 6: 1-4). Tal era o esplendor de sua canção que os próprios alicerces do limiar do templo tremiam ao som. À primeira vista, essas palavras parecem estar fora de lugar neste momento do serviço. No entanto, a realidade é que não há nada neste mundo inteiro que compare com o milagre da presença corporal de Jesus para alimentar seu povo.

Nesta refeição Deus está invadindo nosso mundo para nos dar vida. Não é de admirar que nosso grito repetido seja "Hosana nas alturas". O que é mais necessário neste mundo agonizante do que a salvação do Senhor?

A segunda metade do Sanctus contém uma declaração tão audaciosa quanto a primeira. Aqui temos o nosso próprio pequeno Domingo de Ramos. Assim como as multidões clamaram a Jesus quando ele entrou em Jerusalém, assim declaramos: "Bem-aventurado aquele que vem em nome do Senhor" (Mt 21: 9, Salmo 118: 26).

O Céu continua entrando em nosso mundo quando Jesus, nosso humilde rei, vem cavalgando em nosso meio em nome do Senhor. Esta confissão no santuário de presença real de Jesus é tão significativa que Lutero propôs mover o Sanctus para depois das Palavras da Instituição, a fim de destacar a realidade das palavras que cantamos.

Palavras de Nosso Senhor

Entre muitos cristãos, as palavras de Jesus que freqüentemente chamamos de Palavras da Instituição não são mais do que um relato histórico: isto é o que Jesus fez e o que ele disse. Pronto.

No entanto, temos sido abençoados por saber que essas palavras significam muito mais. Eles fazem o que dizem. De acordo com o mandamento de Cristo, celebramos a Ceia do Senhor não como uma mera refeição de lembrança, mas como um Sacramento pelo qual o próprio Jesus vem a nós. Não nos transportamos de volta no tempo; Em vez disso, ele vem até nós e traz o céu à terra para nosso benefício.

É claro que, no céu, não receberemos a Ceia do Senhor. Ali teremos Jesus - o Pão dos Céus - em toda a sua plenitude. Por enquanto, enquanto esperamos seu retorno, ele vem ao nosso encontro neste infestado pelo pecado, vindo como nosso defensor e libertador, oferecendo seu próprio corpo e sangue como o remédio da imortalidade.

Aqui encontramos força para a jornada, como Cristo habitando em nós e nós nele. E quanto mais partilhamos deste alimento sagrado, maior será o nosso desejo de estar com Cristo para sempre.

Nas palavras do grande hino eucarístico de Tomás de Aquino:


Jesus, a quem agora vejo sob véus,
peço-te que se cumpra o que mais anseio:
que vendo o teu rosto descoberto,
seja eu feliz contemplando a tua glória.
(Lutheran Service Book, 640)

Agnus Dei

Voltando-se novamente ao Apocalipse de São João, em certo ponto João vê um pergaminho na mão direita daquele que estava sentado no trono. Então é perguntado: "Quem é digno de abrir o livro e quebrar seus selos?" Então, entre o trono e os anciãos, o Cordeiro aparece. Sem dúvida, a característica mais significativa na descrição de João deste Cordeiro é que é um cordeiro que parece ter sido morto.

Quando cantamos o Agnus Dei, "Cordeiro de Deus, que tiras o pecado do mundo, tem misericórdia de nós", estamos pregando e orando ao mesmo tempo. Afinal, com estas mesmas palavras, João Batista apontou seus discípulos para Jesus (João 1:29, 36).

Ao nos prepararmos para banquetear-nos com o Cordeiro de nossa salvação, nós realmente proclamamos aquele que deu sua vida por nós. Aqui está o Cordeiro de Deus! Contudo, nós também oramos ao que agora está presente em seu corpo e sangue. Nós oramos por misericórdia, misericórdia daquele que mostrou as verdadeiras profundezas de misericórdia e compaixão quando foi silenciosamente levado ao sacrifício, como Isaias relata no capítulo 53 de seu livro.

Voltando mais uma vez à visão do céu do apóstolo João, mais tarde ouviremos sua descrição dos santos com vestes brancas.

Então um dos anciãos me perguntou: "Quem são estes que estão vestidos de branco, e de onde vieram? "Respondi: "Senhor, tu o sabes". E ele disse: "Estes são os que vieram da grande tribulação e lavaram as suas vestes e as branquearam no sangue do Cordeiro." (Apocalipse 7:13-14). Este é o sangue da nossa redenção, o sacrifício propiciatório que foi prefigurado na primeira Páscoa, quando o sangue dos cordeiros de um ano foi polvilhado no batente das portas como sinal de que o sangue já havia sido derramado naquela casa.

No seu hino de Páscoa, Martinho Lutero aplica esse acontecimento a nós, revelando assim a nossa posição perante o Pai:

Veja, seu sangue agora marca nossa porta; 
A fé aponta para isso; 
A morte passa, 
E Satanás não pode nos prejudicar. 
(Lutheran Service Book, 458)

Assim é em cada celebração da Sagrada Eucaristia. O sangue do Cordeiro é dado para que bebamos e sua carne é entregue para que comamos. Claramente, a misericórdia de Deus é mostrada, e sua paz repousa sobre nós.

Distribuição

Tentem por um momento imaginar a multidão celestial de pé diante do trono de Deus no Último Dia. Os números serão surpreendentes. E ainda, unidos como todos nós somos a Cristo, o Esposo, seremos um - sua Noiva eleita. À medida que os fiéis se encaminham para o altar para banquetear-se com o Pão da Vida na distribuição, é-lhes dado um vislumbre daquela santa Noiva.

Ah, sim, vemos todas as suas verrugas e manchas: as pequenas discussões sobre assuntos triviais, os profundos desentendimentos sobre questões mais pesadas e as maneiras dolorosas em que às vezes tratamos um ao outro. No entanto, por nossa confissão comum da verdade, somos um em Cristo. Como Cristo se entrega a nós nesta santa refeição, ele fortalece essa unidade e nos obriga a amar uns aos outros com um amor profundo e permanente. Como pode ser de outra maneira, se somos enviados do altar com a bênção para partir em paz?

Nunc Dimittis

Outra contribuição luterana à liturgia da igreja é o uso do Nunc Dimittis como o cântico pós-comunhão: "Senhor, agora despede em paz o teu servo". À primeira vista, parece que estamos tomando as palavras de Simeão completamente fora de contexto. Afinal, o que sua experiência tem a ver com a nossa?

Como pode a Sagrada Comunhão se comparar com a honra única de Simeão de segurar o menino Jesus em seus braços durante a primeira visita da criança ao templo na tenra idade de 40 dias (Lucas 2: 25-38)?

Claro, gostaríamos de ter estado no templo e partilhado da experiência de Simeão. Porém, também daríamos qualquer coisa para termos sido os primeiros - junto com os pastores - a ver o Menino Jesus, ou ter estado com os Magos enquanto ofereciam seus dons a ele.

Mas, como Lutero ensinou de maneira tão perspicaz, não encontramos Cristo nesses lugares. Através dos eventos de sua encarnação, nascimento, crucificação e ressurreição, nosso Senhor realizou nossa salvação. Mas os benefícios de sua obra salvífica - perdão, vida e salvação - são distribuídos a nós através de seus meios de graça, Palavra e Sacramentos. Não podemos voltar a ficar com Simeão no templo. A boa notícia é que não precisamos.

Então, quando, após a recepção da Ceia do Senhor, cantamos o antigo cântico de fé de Simeão - "Senhor, agora despedes em paz o teu servo" - nada poderia ser mais apropriado. Na verdade, nossos olhos viram sua salvação. Melhor ainda, temos provado e visto que o Senhor é bom (Salmo 34: 8).

Então, o que poderia ser melhor do que segurar o menino Jesus em nossos braços? Que tal comer e beber seu corpo e sangue dado para o perdão de nossos pecados? Este é realmente o céu na terra, porque aqui temos Jesus e todos os seus benefícios.

Bênção

"O Senhor te abençoe e te guarde."

Recordem as palavras de Jesus na parábola das ovelhas e das cabras: "Vinde, benditos de meu pai, herdai o reino".

A bênção que Deus nos fala na Bênção Final nos prepara para essa convocação final. Ao longo do Serviço Divino, Deus está nos transformando em sua semelhança, estabelecendo em nós uma fé mais profunda e duradoura em relação a Ele e um amor persistente e firme uns pelos outros.

"O Senhor faça resplandecer o seu rosto sobre ti e tenha misericórdia de ti".

Em seus relatos da Transfiguração de Jesus, os evangelistas nos dizem que Jesus brilhou mais forte do que o sol, levando Pedro a dizer: "Senhor, é bom para nós estar aqui".

No céu teremos a mesma resposta porque será bom - muito bom - estar na presença da Luz do mundo.

Por enquanto, vemos apenas vagamente, mas então vamos ver cara a cara. Ainda assim, é bom estar aqui mesmo neste céu na terra, no Culto Divino, pois já aqui Deus nos derrama sua abundante graça.

"O Senhor levante o seu rosto sobre ti e te dê a paz".

Nós, cristãos, somos verdadeiramente abençoados porque Deus não esconde seu rosto de nós. Em todas as outras religiões há, em última instância, dúvidas quanto às atitudes de seus deuses em relação a elas.

Como pode ser diferente, visto que seus deuses são a criação de sua própria imaginação? Mas o nosso é o criador do céu e da terra. Para ser mais exato, é um juiz severo que tem todo direito de castigar o pecador. Mas na pessoa de seu Filho único, vemos a verdadeira natureza de nosso Pai, seu coração paternal de amor. Esse é o semblante que ele levanta sobre nós em sua santa Palavra e Sacramentos, quando ele revela sua misericórdia e graça.

Onde o Senhor abençoa e faz resplandecer o seu rosto e levanta o seu semblante gracioso sobre nós, há paz. Não a paz deste mundo, mas a paz entre Deus e seu povo fiel. Sabemos que há paz porque até agora, na Palavra e nos Sacramentos, temos Jesus e todos os seus benefícios. E no céu descansaremos em sua paz eterna. Amém

Texto adaptado por nós.
Original aqui

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