maio 11, 2017


A abordagem luterana à doutrina da eleição é de que as passagens da Escritura sobre o tema foram escritas para nossa garantia de que em Cristo a salvação está nas mãos de Deus, ou seja, inteiramente fora de nossos poderes. Nós não escolhemos Cristo, mas Cristo nos escolheu. 

Nós sustentamos que os eleitos são aqueles que, no final, serão salvos, mas isso não significa que podemos especular e ir além do que está oculto para nós em relação à inescrutável vontade de Deus. O que isso quer dizer? Quer dizer que seria uma abordagem racional assumir que a salvação é uma obra completamente de Deus e que a eleição se destina somente a alguns, e consequentemente Deus não deseja salvar todos. 

Lutero rejeitou essa ideia. Ele advertiu contra tal pensamento em seu De Servo Arbítrio (Utilidade Pública: cuidado com versões condensadas dessa obra que são distribuídas por ai), seus sermões, seu Comentário sobre o Gênesis, etc. Para ele, o Deus oculto deve ser distinguido do Deus revelado. O Deus revelado é o Deus que se encarnou através do nascimento virginal, obedeceu a lei em nosso lugar, e pagou por nossos pecados na Cruz. Este é Jesus, o Deus que se revelou no Evangelho que vem a nós na Palavra e nos Sacramentos. Ele deseja salvar a todos, embora nem todos sejam salvos. 

Por que alguns são salvos e outros não, se Deus quer salvar todos e a salvação é, do começo ao fim, uma obra de Deus?

É aí que Lutero e as Confissões Luteranas afirmam que devemos nos calar, visto que é proibido para nós especular para além do que nos foi revelado (Deus absconditus). Para o luteranismo, o Deus oculto é o Deus da lei, que se esconde de nós pecadores, já que ninguém pode vê-Lo e continuar vivendo. Assim, a distinção entre o Deus escondido e o Deus revelado está ligada à distinção entre lei e evangelho. O evangelho é Cristo crucificado por nós. E essa é a Palavra de salvação: que Cristo vem a todos com a Graça. E a culpa recai sobre aqueles que não O recebem. Em outras palavras, enquanto a salvação pertence a Deus, a condenação está inteiramente em nossas mãos. Não devemos duvidar de que Deus deseja salvar a todos. Como li por aqui recentemente: Para ir pro inferno é preciso passar sobre o cadáver do Filho de Deus e ignorá-lo.

Lutero se recusou a abraçar a ideia de que se Deus não salva a todos, Ele deve ser um Deus fraco, ou um Deus injusto. Basta-nos saber que Aquele que nos elege é capaz de nos converter e nos manter salvos. 

Para Lutero, manter a salvação também é obra que pertence somente a Deus. Na sua opinião, mesmo que a mensagem do Evangelho seja rejeitada após anúncio da Palavra e Sacramento, ela (a vontade de Deus em salvar) ainda permanece. Para ser verdadeira, a vontade de Deus não depende de nossa fé. Então, em que sentido isso é uma segurança para nós?

Para Lutero, o que é verdadeiro para todos (a expiação de Deus, vontade de salvar/graça) torna-se objetivamente verdade para nós pessoalmente. Em outras palavras, só podemos saber que Cristo morreu por cada um de nós, se Ele tiver morrido por todos. Do mesmo modo, só podemos saber que Jesus deseja nos salvar com Sua graça, se Ele realmente quer fazê-lo por todos. 

Lutero rejeitou qualquer idéia de que podemos ter certeza de que Deus quer nos salvar ou que Cristo morreu por nós, se olharmos para nossa própria fé. Para ele, isso seria fé na fé. Na sua opinião, a fé deve olhar para fora. Olhar para onde? Para a salvação que está em Cristo, e nos é oferecida na Palavra e nos Sacramentos. 

Para ele, a salvação, sendo obra de Deus, nos diz que não podemos olhar para dentro de nós e nos assegurar se somos honestos com nós mesmos. Ao olharmos para nós mesmos, só poderemos ver um pecador que precisa ser redimido, o que não é garantia. Portanto, a fé só deve se apegar ao que Deus dá e oferece na Palavra e no s Sacramentos, que é a obra objetiva de Cristo sendo oferecida a todos. 

E isso me leva ao meu próximo ponto: a eleição, segundo o luteranismo, é tanto cristológica quanto sacramental. Na visão de Lutero, nossa predestinação brilha quando podemos dizer: "Eu sou batizado, sou filho de Deus por causa do meu batismo". Ou quando as palavras de absolvição são ditas para assegurar que o perdão que Cristo conquistou na Cruz por nós ainda está conosco. Ou quando Ele entrega Seu Corpo e Sangue na Eucaristia. Ele está verdadeiramente presente na Palavra e nos Sacramentos para entregar a si mesmo e Seu perdão como garantia objetiva e externa. E podemos confiar que, em Cristo dado de fora de nós na Palavra e nos Sacramentos, temos a certeza de que somos eleitos. Eleitos em Cristo!

Para Lutero, se uma pessoa cair da graça e se perder, não significa que Deus não desejou salvá-la. As passagens das Escrituras que advertem contra a apostasia são realmente passagens da lei para alertar um crente que caiu no pecado e se sente confortável. A intenção é afligi-lo com a necessidade de contrição e desejo de perdão. As passagens de garantia de salvação (incluindo as da eleição) são realmente passagens do evangelho que asseguram e consolam aqueles que sentem pesar pelo seu pecado e desejam o perdão que o evangelho oferece. 

Lei e Evangelho também se aplicam a como pregar aos perdidos. Lei e Evangelho andam de mãos dadas. O perdido precisa de lei para saber que precisa de perdão, e precisa ouvir o evangelho que mostra Deus gracioso e misericordioso.

Por fim, achamos conforto somente em Cristo crucificado por nossos pecados. É em Cristo que encontramos nossa predestinação. O que passa disso, é especulação e doutrinas de homens, baseadas em conclusões racionalistas e anti-escriturísticas. 

Equipe SJEP

Um comentário:

  1. Olá. Se você gostar, o livro de concórdia (os fundamentos do luteranismo) da editora sinodal, na fórmula de concórdia, da Igreja Luterana, exprime uma visão pouco mais profunda sobre eleição. Vou deixar aqui. "Uns são salvos e outros não
    porque alguns resistem e rejeitam a graça que é oferecida a todos, e outros
    não" "A eterna eleição de Deus, porém, não só vê e
    sabe antecedentemente a salvação dos eleitos, mas, por graciosa vontade e
    beneplácito de Deus em Cristo Jesus, também é causa que cria, opera, ajuda e promove a nossa salvação e tudo o que ela pertence." "Cremos,
    ensinamos e confessamos que essa fé não é mero conhecimento da
    história de Cristo, mas uma espécie de dom de Deus por meio de que
    reconhecemos retamente a Cristo nosso Salvador, na palavra do
    evangelho e nele confiamos que somente por causa da sua obediência
    temos, de graça, perdão dos pecados, somos considerados santos e
    justos por Deus e somos eternamente salvos." A Graça e a Paz seja contigo. Caso tenha interesse. https://www.smashwords.com/books/view/726258

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