janeiro 24, 2018

Doutrina da Igreja nas Confissões Luteranas


Por Rev. Jason D. Lane

Em 1521, Thomas Murner, um dos primeiros oponentes católicos de Lutero, atacou a visão de Lutero sobre a Igreja e o acusou de "construir uma igreja da mesma maneira que Platão construiu uma cidade" (cf. LB 39:218). Para Murner, Lutero havia apresentado a igreja como um produto da imaginação que não tem permanência na realidade. Em oposição aos seus oponentes católicos, Lutero ensinou que a Igreja é "um reino espiritual" que não se poder ver a simples vista nem compreender pela própria razão. Em outras palavras, a igreja é um artigo de fé: "Creio em uma santa igreja católica." No entanto, isso não significa que a igreja seja irreconhecível. O artigo VII da Apologia afirma a explanação de Lutero e, no entanto, argumenta contra uma igreja imaginária: "E nós, deveras, não sonhamos uma sociedade platônica, como alguns impiamente sofismam, porém dizemos que existe essa igreja, a saber, os deveras crentes e justos, esparsos por todo mundo e adicionamos as notas: a doutrina pura do evangelho e dos sacramentos." (Ap VII: 20)

As Confissões Luteranas fazem uma distinção entre a igreja "estritamente falando", a qual pertencem todos os crentes esparsos por todo o mundo (CA VII), e a igreja "admixti" (misturada), isto é, a igreja visível na qual os céticos estão misturados com os santos e podem, inclusive, servir nos ofícios da igreja (CA VIII). A designação típica para isto é igreja escondida e igreja visível. Uma vez que nossa nomenclatura LCMS foi deslocada das Confissões, vale a pena notar que os escritores confessionais sabiam e evitavam o termo "igreja invisível". A Igreja nunca é invisível porque a Palavra e os Sacramentos nunca são invisíveis.

Então confessamos que a igreja está oculta e visível. A Apologia VII estabelece que "a igreja não é apenas sociedade de coisas externas e ritos, como acontece em outros governos, senão que é, principalmente, sociedade de fé e do Espírito Santo nos corações" (Ap VII: 5). Ademais: "Se definirmos a igreja como sendo apenas governo externo de bons e maus, não entenderão os homens que o reino de Cristo é justiça do coração e o dom do Espírito Santo; julgarão que é somente observância externa de certas formas cultuais e ritos" (Ap VII: 13) A igreja não é criação da lei, mas uma criação do evangelho. Essa é a principal preocupação nas Confissões, quando confessam que é a assembleia de todos os crentes.

Essa é a grande distinção entre a doutrina luterana sobre a igreja e todas as demais na cristandade ocidental. Devido ao fato de que as Confissões Luteranas colocam toda ênfase na doutrina da igreja sobre a obra de Deus através da Palavra e Sacramentos, a igreja se salva do instintucionalismo de Roma por um lado e do individualismo dos reformados e protestantes radicais por outro. A igreja existe e existirá para sempre porque Deus continua criando e mantendo-a através da pregação do evangelho e da administração dos sacramentos. A igreja não pode ser governada pela lei, nem pode se basear na razão ou nas emoções das pessoas. 

A doutrina da igreja não é  abstrata ou flutuante, senão que se confessa concretamente, baseada somente na obra de Deus através dos meios da graça. Nossas confissões tomam como uma questão de fato que "nossas igrejas" são manifestações da santa igreja católica, não por sua própria pureza, mas pelo poder purificador da Palavra de Deus e dos Sacramentos. Por esta razão, os cristãos podem ser encontrados onde se encontra o evangelho. "Graças a Deus", escreve Lutero, "uma criança de sete anos sabe o que é a igreja: os santos crentes e 'os cordeirinhos que ouvem a voz de seu pastor' (AE III, XII), 2). Em um sentido muito real, então, a igreja desfruta da unidade completa e perfeita onde quer que alguém escute a voz de Cristo, até mesmo se raramente experimentamos esta unidade aqui e agora.

CA VII declara: Porque para a verdadeira unidade da igreja cristã é suficiente que o evangelho seja pregado unanimemente de acordo com a reta compreensão dele e os sacramentos sejam administrados em conformidade com a palavra de Deus. E para a verdadeira unidade da igreja cristã não é necessário que em toda a parte se observem cerimônias uniformes instituídas pelos homens." Novamente, as Confissões nos levam de volta à palavra e obra de Cristo administrada a nós através do Ofício da Pregação, o mesmo que Cristo estabeleceu e transmitiu através de Seus apóstolos, para que as pessoas creiam nele (Romanos 10.14; CA V). Esta entrega da salvação é obra de Deus. E onde quer que a encontre, ali está a verdadeira Igreja. Quando os escritores das Confissões descrevem a igreja visível, onde todavia existem os céticos, sempre retornam às promessas de Deus, especialmente a promessa de que só há uma, santa, católica, e a igreja apostólica de Deus, e não de alguma instituição ou país em particular. A confissão de que a igreja permanecerá porque Cristo permanece é um consolo real para os cristãos que vivem em dias obscuros quando a santidade da igreja parece perdida, "para que não desesperamos, mas que saibamos que a igreja permanecerá; para que saibamos que por maior que seja a multidão dos ímpios, no entanto, a igreja existe e Cristo outorga os dons que prometeu à Igreja: o perdão dos pecados, a oração respondida, o dom do Espírito Santo. "O trabalho de Deus é seguro e, portanto, a igreja, sua própria criação, é tão segura.

O Reverendo Jason D. Lane é Professor Assistente de Teologia na Concórdia Universitu Wisconsin, em Mequon, WI.

Publicado originalmente em www.lutheranreformation.org

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